QUINTETO DE OURO - KATE WINSLET

Chegou a vez de mais uma atriz fantástica brilhar no Quinteto de Ouro. Depois de Meryl Streep e Julianne Moore, a seção mensal do blog em que listo meus cinco favoritos de temas quaisquer relacionados a cinema é dedicada a Kate Winslet, britânica com beleza e talento em iguais proporções: imensas. Como sempre, a tarefa de formar uma seleção de apenas cinco componente é hercúlea, mesmo porque os temas são escolhidos a dedo e surgem mares de opções. Mais uma vez, recorri ao critério da ordem cronológica para não enlouquecer com os níveis de paixão muito próximos por cada uma das atuações presentes, e o resultado ficou bastante satisfatório, ao menos até que novas atuações arrebatadoras surjam. A essa altura, aliás, estou à espera de sua primeira (sim, que venham outras!) parceria com Woody Allen no vindouro Wonder wheel - já quero indicação ao Oscar seguida de vitória...

Falando em Oscar, ela já foi indicada sete vezes, quase todas na categoria de atriz principal, e demorou a levar sua primeira (sim, que venham outras!) estatueta. Faz somente 8 anos que a vimos subir ao palco e discursar com genuína emoção pelo reconhecimento do trabalho realizado em O leitor (The reader, 2008). Deveria ter levado antes o prêmio pela Clementine de Brilho eterno de uma mente sem lembranças (Eternal sunshine of the spotless mind, 2004), onde se mostrou versada em um senso de humor melancólico que fazia dobradinha com as várias cores de cabelo. A própria Kate considera esse seu papel mais querido. Mas a Academia tem dessas mancadas, e estatuetas à parte, é visão praticamente unânime (totalmente entre as pessoas que conheço) que Winslet bate um bolão. No mesmo ano em que levou o Oscar, a propósito, ela foi duplamente premiada no Globo de Ouro, curiosamente como coadjuvante pelo mesmo O leitor e como principal por Foi apenas um sonho (Revolutionary road, 2008). Que ano para ser fã dessa mulher!

Sua carreira de atriz data de 1991, quando iniciou na televisão de seu país, então com 16 anos. A estreia no cinema foi sob a direção de Peter Jackson em Almas gêmeas (Heavenly creatures, 1994), pelo qual já foi elogiada. Ainda não conferi seu début, mas cinéfilos sempre têm pendências em suas listas, e mesmo Winslet sendo uma das minhas prediletas, acabo adiando os filmes que ainda me faltam, só para não zerar as opções. De lá para cá, ela contabiliza mais de 30 papéis em longas-metragens e em parte deles responde pela dignidade das produções. Como as já citadas Streep e Moore, ela tem o dom raro de escapar ilesa das críticas em filmes de gosto e qualidade duvidosos. Como já estamos no terceiro parágrafo, não quero me alongar mais, então deixo vocês, leitores, com meus cinco mais de Kate Winslet.

1. Brilho eterno de uma mente sem lembranças (Eternal sunshine of the spotless mind, 2004), de Michel Gondry


A primeira atuação memorável de Winslet foi na pele da maluquinha Clementine Kruczynski , interesse amoroso do travado Joel (Jim Carrey) em um encontro casual dentro de um trem. Seus cabelos em uma cor inusitada já denunciavam uma personalidade exótica e inquieta, corroborada por seu discurso sincero para o então futuro namorado: ela enjoa com facilidade. E não dá outra, pois o passar de pouco tempo já consome o seu entusiasmo com aquela relação, e vem uma ideia na qual todos nós já pensamos algumas vezes: apagar da memória lembranças que se tornaram indesejadas. No argumento proposto por Gondry e transformado em roteiro por Charlie Kaufman, esse pensamento pode se converter em atitude, e ela parte para uma clínica especializada no procedimento de remoção de recordações, um golpe e tanto no coração já partido de Joel. Em boa parte da narrativa do longa - premiado com o Oscar de melhor roteiro original -, Clementine é vista sob a ótica do ex-namorado, e qualidades e defeitos se misturam no seu pensamento invadido pelos profissionais da clínica. É uma personagem complexa. Humana, demasiadamente humana, afinal.

2. O amor não tira férias (The holiday, 2006), de Nancy Meyers


O ano de 2006 foi de dois grandes trabalhos na carreira da atriz, cada um com um diferente grau de visibilidade. Sua presença ainda rara em comédias foi marcada nesse simpático trabalho com a assinatura de Nancy Meyers, em que vive Iris, jornalista inglesa que vive uma desilusão amorosa - parece até castigo pelo que fez Joel passar como Clementine. Na tentativa de superar a dor de cotovelo ela faz um intercâmbio de casas com a estadunidense Amanda (Cameron Diaz, também divertida), também à volta com questões do coração. Como evidencia o título nacional, elas acabam não muito longe de novos amores, e Iris mostra a capacidade de Winslet para ser deliciosamente desengonçada no que se refere aos sentimentos, além de um timing cômico bem acertado. Não é de seus trabalhos mais vistos ou comentados, e o roteiro não é nenhum primor, funcionando bem para uma sessão da tarde com a chuva caindo lá fora, mas um feijão com arroz também mata a fome com muita eficiência.

3. Pecados íntimos (Little children, 2006), de Todd Field


Encarnar personagens multifacetados é uma especialidade de Winslet, e Pecados íntimos está aí para confirmar mais uma vez tal observação. Curiosamente, a adaptação do livro Criancinhas, de Tom Perrotta, não era ideia inicial de Todd Field. Ele queria verter para o cinema Revolutionary road, projeto que acabou não indo à frente, mas foi parar nas mãos de Sam Mendes, então marido de Winslet, que também atuou no longa baseado no romance de Richard Yates. No longa pelo qual concorreu ao Oscar como atriz principal com Meryl Streep (olha ela de novo), entre outras, ela interpreta Sarah Pierce, que assim como Clementine, não vê mais graça na rotina. Suburbana de nenhuma amiga real, ela encontra alento na paixão adúltera por Brad (Patrick Wilson), erguendo seu castelo de areia que, cedo ou tarde, começa a ruir. É um de seus desempenhos mais contidos, cheio de força no olhar e despido de qualquer caracterização especial, e até mesmo a mais básica maquiagem ficou ausente. Ela está naturalmente linda, mas sua beleza é sufocada no caos emocional que se lhe instala, e tarde para ir embora.

4. O leitor (The reader, 2008), de Stephen Daldry


Fazia tempo que Winslet e Daldry queriam trabalhar juntos. Ele havia pensado na atriz para dar vida à Laura Brown de As horas (The hours, 2002), personagem que acabou por ser interpretada por Julianne Moore (olha ela de novo). Depois de ter visto três vezes o longa, confesso que não consigo imaginar Winslet no papel, magnificamente defendido por Moore. Seis anos depois, o encontro de atriz e diretor no set finalmente aconteceu e ela deu conta de viver Hanna Schmitz, cobradora de semblante sempre sisudo que tem seu cotidiano anódino sacudido ao ajudar um rapaz acometido por um mal estar. O tórrido relacionamento com ele se estende por algum tempo, até que ela desaparece de sua vida, para ressurgir muitos anos depois em um cenário e situação bastante desagradáveis, para dizer o mínimo. Novamente Winslet demonstra a força do seu olhar, aqui exibindo um misto de arrependimento, nostalgia e culpa no reencontro inesperado com Michael (agora na pele de Ralph Fiennes). Foi com ele que Hanna teve o gosto de acessar obras literárias, que de outro jeito não teriam passado para ela de amontoados de letras e frases incompreensíveis.

5. Deus da carnificina (Carnage, 2011), de Roman Polanski


Muitos resumem esse papel de Winslet à cena do vômito, passagem catártica que ocorre depois de longos minutos de diálogo na adaptação da peça teatral de Yasmina Reza. Sob a regência de Polanski, ela faz bem mais que lançar dejetos estomacais, e divide a cena brilhantemente com Jodie Foster, Christoph Waltz e John C. Reilly, todos vivendo pais empenhados em não descer do salto da correção política para administrar um caso de briga entre dois meninos, cada um deles filho de um dos casais. O filho Nancy (Winslet) e Alan (Waltz) acerta o outro garoto com um taco, que lhe arranca dois dentes. Todos ali são verborrágicos, e sua Nancy coloca a boca no trombone, sendo uma das primeiras a abandonar os meios termos e culminar na referida cena que tem leitura metafórica também nesse retrato do discurso hipócrita. Winslet e seus colegas fazem rir de nervoso, espezinhando nossas mazelas sob a forma de um código linguístico muitas vezes não condizente com a linguagem corporal e dissolvendo o tênue verniz social da cordialidade. Outra cena maravilhosa de Nancy é quando ela joga longe o celular de Alan, até então sempre grudado no aparelho com mil telefonemas.

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